sexta-feira, agosto 12, 2005

POR FAVOR, IMPEACHMENT, AINDA NÃO.

Já faz alguns anos que a cidadania brasileira vem alertando sobre a inconsistência de políticas públicas, sempre justificadas politicamente pela quase unanimidade de nossas autoridades, sob o argumento das mais diversas carências nacionais.
Os poderes brasileiros, sempre harmônicos a proteger elucubrações econômicas garantidoras de lucros das maiores empresas e bancos, acostumaram-se a repassar a conta ao povo, sempre um distraído observador, embora pagante da realidade nacional.
Pelo menos foi o que sempre ocorreu até o advento do atualmente onipresente “mensalão”, onde num show midiático, passou nossa sociedade a acompanhar em tempo real o descortinamento de uma fraude coletiva, que vem se avolumando em escala geométrica no poder legislativo e aritmética nos outros poderes, o indolente executivo e o paquidérmico judiciário.
Do conflito e inquisição das CPIs, em meio a tantos discursos de moralidade de parlamentares, surgiram todas as abordagens e teses possíveis, das conspiratórias, às mais ordinárias. Alguns intentam desde o inicio, diminuir a crise, sustentando ser o “caixa 2” uma prática nacional arraigada e que o Presidente não seria responsável por toda a sua equipe e pelos atos mundanos que praticou, em nome do Brasil. Outros, especialmente os mais privilegiados, elucubram a necessidade da estabilidade econômica e a feitura de um “pacto de governabilidade”, o que é alcunhado pela choldra de “acordão”, como se a economia fosse um “poodle” e os seus idealizadores, os salvadores da dignidade nacional.
Mas de repente, o molho ficou salgado e as pizzas perigosamente insaborosas, pois politicamente está ficando impraticável prosseguir nas apurações e evitar que descubra o povo brasileiro que muito pior do que são alguns deputados e partidos políticos, é o que fizeram, com tanto dinheiro de origem escusa e ainda desconhecida, sendo evidente, contudo, que foi moeda de troca por inumeráveis políticas públicas, incrustadas em leis, atos administrativos e contratos, superfaturados, sub-contratados, alterados e aditados, muitos acompanhados da competente nota fiscal, que terminaram por garantir fonte de receita blindada ao controle popular, já que protegidos por lei! Como são todas as vantagens que o Governo propicia apenas para os grandes grupos econômicos, que por serem os maiores pagadores de impostos, podem sobre-valorizar seus preços, garantir suas tarifas, seus reajustes, seus oligopólios de mercado e suas concessões, diante de toda a pouca vergonha, que é o pagamento quase generalizado de butins. Para estes a burocracia é barata, os impostos razoáveis, não existe inflação e as oportunidades são abundantes. E o pior, em nome da lei.
E de repente, o risco passa a ser demasiado, com tal proporção e abrangência, que o anteriormente refutado impeachment do Presidente, transforma-se num grande negócio político (para os políticos, não para a nação), sob o argumento de não poderem se aprofundar e enterrar algumas Instituições nacionais, preferindo exibir em praça pública a cabeça do Presidente, já em inicio de franco descrédito, para aplacar a opinião pública e evitar assim, a ira nacional. Como se fosse um mero jantar entre amigos em um restaurante, quando os comensais, já fartos, pedem a conta, levantam-se e vão embora como se o banquete tivesse terminado e não houvesse tantos restos em cima das mesas.
O que significa dizer que no presente momento, é absolutamente inaceitável o impeachment do Presidente, por este pretender dar um fim político a problemas muito mais sérios e complexos, que merecem ser juridicamente enfrentados pelos Tribunais, para que ao final, apenas no final, sejam condenados os culpados.
E é recomendável que o Poder Judiciário efetivamente venha a condenar os verdadeiros culpados, que são os poderosos arquitetos e engenheiros da fraude e não os sacadores de tostões, que nada mais são do que os ‘sem sorte’ que foram apanhados na boca dos caixas e já estão sendo entregues às feras.
Nunca houve maior chance para que sejam analisadas as políticas públicas e testadas a sua veracidade e coerência, e para que sejam conhecidos os verdadeiros asseclas do país, se o pobre povo e as pequenas empresas nacionais que não conseguem pagar seus impostos, ou aqueles que emitem nota fiscal a justificar a fraude.
Agora que estão publicamente disponíveis as informações fiscais e bancárias, as ligações telefônicas, sendo possível o cruzamento quase infinito de dados e relações, seria lastimável para o Brasil, que fossem jogados tantos elementos numa cova rasa, apenas por estar coberta com a cabeça de nosso Presidente.
E a economia resistirá, pelo menos deverá resistir, caso sejam autênticos os tantos discursos feitos em nome das políticas públicas de suposto interesse do Brasil, pois nenhuma empresa séria deverá estar envolvida nas tantas falcatruas que passaram a fazer parte do passivo do povo brasileiro. Talvez até caia a bolsa e suba o dólar, mas num futuro próximo, nossa democracia mostrará a dignidade do povo brasileiro, que não parará, nem de acreditar, nem de continuar a exercer seu talento. Em verdade, talvez até volte a valer efetivamente o talento e a criatividade do brasileiro, que não mais estará com seu sofrimento a avalizar o lucro de bandidos de polainas, que nada mais são do que pagadores de butins.
Enfim, apesar de tanto, o tudo poderá ser nada, caso seja dado, tão cedo, um desfecho como o impeachment, ainda que aparente ser politicamente justificável.
É possível até que as apurações, às quais todos aguardam iminente desfecho, estejam apenas começando e que sejam descobertos outros operadores de dinheiro público, os seus financiadores e acima de tudo, as fontes da receita. Também é possível que muitas das recentes taxas, tarifas e reajustes que os brasileiros têm se acostumado a pagar sem reclamar, tenham finalmente revelada a sua real justificativa, uma política incívica, incoerente com o discurso de então candidatos e com a vontade e a capacidade popular. E que os contratos, as licitações e concessões praticadas pelo poder público pelo país afora venham a ter seus preços ajustados à legalidade e moralidade administrativa, sempre contornada pelas autoridades, em nome da suposta estabilidade.
Enfim, não há progresso sem dor, nem civismo e cidadania sem participação ou conhecimento pleno da realidade. Sem elucubrações estatísticas, mentiras ou meias-mentiras, pois o Brasil não mais aceita ser enganado e precisa saber.
Portanto pede-se: Menos. Calma. Por favor, Impeachment, ainda não.

Artigo escrito em 12/08/2005. Autorizada a publicação e divulgação.