Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz Federal da Vara – Seção São Paulo
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.“O Estado tem o dever de assegurar que as necessidades individuais e coletivas continuem a ser satisfeitas, depois de produzida a privatização. A empresa privada que assumir a atividade correspondente ao serviço público, ... terá o dever de fazê-lo em termos universais, com observância dos princípios da igualdade, da continuidade e da modicidade de tarifas.
Ocorre que a solução para atender os interesses gerais não envolve apenas o ângulo econômico. O problema apresenta outras dimensões. No mínimo, há que se enfrentar os temas políticos, socioeconômicos e axiológicos envolvidos.
Sob o ponto de vista político, é necessário avaliar a questão do poder e de sua distribuição ... A concentração de poder econômico gera o surgimento de poder político. Os particulares prestadores de serviços econômicos de interesse geral podem adquirir enormes quantidades de riqueza. Essa riqueza poderá conduzir que eles se desvinculem do sistema jurídico e político. A titularidade da riqueza poderá fazer com que o empresário torne-se ‘senhor’ e toda a sociedade se configure como ‘vassala’, em um sistema similar ao feudal”[1].
.A PRO TESTE – Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, inscrita no CNPJ/MF sob nº 04.591.034/0001-59, com sede na Av. das Américas, 500, bloco 18, salas 201/204, Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro – RJ, por sua procuradora (doc. 1), vem, respeitosamente a Vossa Excelência, impetrar o presente
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Mandado de Segurança Preventivo,.Contra o Sr. Presidente Substituto do Conselho Diretor da ANATEL – Agência Nacional de Telecomunicações – Plínio Aguiar Jr. (doc. 2), com sede na SAUS Quadra 06 Blocos E e H, em Brasília, no Distrito Federal, com fundamento no art. 5°, incs. XXXII e LXIX; art. 170, incs. V e VII e 175, da Constituição Federal; nos arts. 4°, incs. I e VII, art. 6°, inc. X e 22, do Código de Defesa do consumidor, nos arts. 2°, inc. I, 5°, 38, 70, 79 e 127, da Lei 9.472/97, art. 7°, do Decreto 4.733/03, nos arts. 1° e seguintes da Lei 1.533/51, bem como nos fatos a seguir articulados.
.I – Introdução
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Está para se perpetrar, no próximo dia 07 de dezembro (doc. 3), uma das mais graves ilegalidades no campo dos serviços essenciais de telecomunicações. A ANATEL assinará com as concessionárias que operam o Sistema de Telefonia Fixa Comutada a prorrogação do contrato de concessão por mais vinte anos.
As minutas dos contratos de concessão, aprovadas pela Resolução n° 341/2003, da ANATEL e que estão para ser assinados, repetem cláusulas cujas ilegalidades já foram reconhecidas pelo Poder Judiciário.
Os resultados da ilegalidade da cláusula de reajuste dos contratos de concessão estão plasmados em dezenas de milhares de demandas judiciais, nas inscrições dos nomes dos consumidores pobres inadimplentes no Serasa e nos números da própria Agência Reguladora, demonstrando que o acesso à telefonia fixa local decresceu 5,4% nos últimos dois anos, como se verá a seguir.
As minutas dos contratos, formulados com base no modelo das telecomunicações desenhado ainda em 1996, ignoram os seguintes fatos:
a) a concorrência esperada no setor de telefonia fixa comutada local não ocorreu, pois os instrumentos regulatórios para garantir o sucesso das empresas entrantes no mercado mostraram-se insuficientes frente a força do monopólio das concessionárias privadas, o que implicou da inviabilidade das empresas espelho;
b) os atuais contratos de concessão permitem um aumento real anual de até 9% acima da correção monetária medida pelo IGP-DI, nos preços dos itens do Plano Básico, que inclui a assinatura residencial, que foram efetivamente aplicados pelas concessionárias, levando a um aumento do preço incompatível com o nível de renda do consumidor médio brasileiro, cujo resultado foi o decréscimo no número de acessos em uso, especialmente nas classes C, D e E;
c) o adiantamento do cumprimento de metas de universalização pelas concessionárias implicou em investimentos por parte dessas empresas que agora buscam seu retorno a todo custo, ignorando o quadro de insatisfação generalizada em todos os segmentos da sociedade por conta do alto custo da assinatura básica;
d) os consumidores mais pobres que não conseguem manter a linha fixa habilitada aderem ao sistema móvel pré-pago, pagando muito mais pelas ligações realizadas e deixam de ter acesso ao serviço essencial;
e) não há previsão na Lei Geral das Telecomunicações, para que se estabeleçam Planos de Serviços exclusivos para os consumidores de baixa renda.
A despeito desta realidade, a ANATEL ignorando pleitos apresentados formalmente para a Agência pela Pro Teste (doc. 4), entre outras entidades representativas, não só desrespeitou o direito inscrito no art. 5°, inc. XXXIII, da Constituição Federal, mas também violou o art. 42, da Lei Geral de Telecomunicações
E isto porque agiu em conluio com as concessionárias, em verdadeiro conchavo (doc. 5), a fim de garantir às empresas o direito à prorrogação dos contratos, sem definir regras de acordo com os procedimentos estabelecidos pela Lei Geral de Telecomunicações e sem proceder à fiscalização necessária para a certificação do cumprimento das metas de universalização e continuidade, que funcionam como condicionantes para a prorrogação das concessões.
Temas fundamentais como a conversão da medição do serviço por pulso para medição por minuto, prevista expressamente no Decreto 4.733/2003, que estabelece sobre a sobre políticas públicas de telecomunicações, foram tratados, sem qualquer transparência em reunião do Conselho Diretor da ANATEL. Vale a transcrição da notícia a respeito desta reunião:
Quinta-feira, 24 de Novembro de 2005
Assinatura de fixo dará direito a 200 minutos
Isabel Sobral
A partir de 2006, a assinatura básica dos telefones fixos residenciais, de cerca de R$ 40 mensais, dará direito a 200 minutos em ligações aos usuários. Essa franquia de uso das linhas telefônicas, originalmente planejada para ser de 170 minutos, faz parte das novas regras da telefonia fixa que entrarão em vigor no ano que vem, quando as concessionárias de telefonia renovarão seus contratos por 20 anos.
Essas regras foram discutidas ontem em reunião de diretoria da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
No ano que vem, as empresas passarão a cobrar as ligações por minutos e não mais por pulsos, como atualmente. Na prática, a mudança altera pouco o preço que os consumidores pagam para falar pelo telefone fixo, mas a Anatel sustenta que haverá maior transparência na conta dos usuários.
A franquia definida ontem pela Anatel não conflita com o chamado "telefone social", cujas regras ainda não foram definidas pelo governo.
Nos novos contratos, está previsto que as telefônicas terão de oferecer uma forma de telefone fixo mais acessível à população de baixa renda. O tema, porém, causa divergências entre o ministro das Comunicações, Hélio Costa, e a Anatel, que defendem propostas diferentes. O presidente interino da agência, Plínio de Aguiar Júnior, disse ontem que "até o último segundo" busca um acordo com as empresas e o Ministério das Comunicações sobre o formato do serviço popular, que terá de constar nos novos contratos. "Isso é uma exigência", afirmou. A Anatel marcou para o dia 7 de dezembro a assinatura dos contratos e espera até lá concluir a negociação sobre o telefone popular.
A agência reguladora também flexibilizou para as empresas o enquadramento nas novas regras de medição das ligações telefônicas por minutos. As concessionárias terão entre o dia 1º de março a 31 de julho de 2006 para adaptarem os seus sistemas operacionais para a nova forma de cobrança. As operadoras poderão escolher por quais localidades iniciarão a conversão. Elas deverão apresentar um cronograma até até o dia 31 de janeiro.
"O objetivo da flexibilização é dar tempo hábil para que haja a completa mudança operacional das quase 40 milhões linhas fixas hoje disponíveis", explicou o superintendente de Serviços Públicos da agência, Marcos Bafutto.
A Anatel também determinou ontem que as empresas não poderão cobrar pela emissão da primeira via da conta telefônica fixa detalhada. Pelos novos contratos, as contas passarão a ser detalhadas, como são hoje as contas de telefone móvel, a partir do momento em que as empresas fizerem a conversão da medição de pulsos para minutos.
Além disso, a diretoria também aprovou ontem a criação do Índice de Serviços em Telecomunicações (IST) que vai corrigir, a partir do ano que vem, os contratos de telefonia fixa. O IST vai substituir o Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) que corrige anualmente os reajustes das tarifas de telefonia.
A prorrogação dos contratos, sem que procedimentos mínimos estabelecidos por lei sejam respeitados, levará a prejuízos irreversíveis para os consumidores e para toda a sociedade brasileira, pois estarão fatalmente inviabilizadas a concorrência plena no mercado de telefonia, a garantia de acesso ao serviço essencial, bem como a possibilidade de instituição de novas regras que façam face ao enorme poder de mercado das empresas que hoje detêm o monopólio privado da telefonia fixa.
Toda a sociedade está mobilizada em torno do tema objeto deste Mandado de Segurança, pois os danos decorrentes da manutenção da fórmula de reajuste da assinatura básica são públicos e notórios. O Relatório da Ouvidoria da ANATEL, divulgado no último mês de outubro deste ano, corrobora essa afirmação (doc. 6). Veja-se parte do Relatório:
“Com base nos dados da Telemar, como exemplo, percebe-se que, tomando-se como referência o STFC-local, a participação da assinatura na receita bruta cresceu de 35%, em 2000, para 52%, em 2004. Esse fato corrobora com o previsto comportamento racional das empresas em aumentar as tarifas do componente da cesta cuja demanda é mais “rígida” e impositiva. Comportamento esse bastante natural e previsível para os conhecedores da teoria econômica.
Do outro lado persiste um clamor insistente da sociedade junto ao judiciário e órgãos de defesa do consumidor, requerendo a abolição da cobrança da assinatura básica. Verifica-se que o desequilíbrio no preço da assinatura, que antes atingia apenas as classes mais baixas, passou a atingir a classe média e causar a mobilização de forças para virar o jogo. A Anatel, que celebrou os contratos de concessão em 1998 e estabeleceu os critérios de reajustes tarifários geradores de tal dilema, não pode se ausentar dessa discussão, ao contrário, deve dela participar, inclusive como propositora da solução do problema. Ademais, o ano de 2005 revela-se oportuno para imprimir mudanças corretivas, em relação à Assinatura Básica, diante da iminente celebração dos novos contratos de concessão que entrarão em vigor a partir do próximo ano.
Ressalve-se, por outro lado, que a eliminação pura e simples da tarifa da assinatura básica, como pretendem alguns, não nos parece uma atitude justa. Isto porque ao assinante do STFC é disponibilizado em sua residência um terminal ligado a um par metálico de fios, conectado a todo um sistema, cuja manutenção e operação desse terminal, fica a cargo da prestadora. Este par de fios, ligado fisicamente a uma central, corresponde a uma integral de custos que deve ser objeto de remuneração. Daí o nosso entendimento da inexistência de fundamentos econômicos que justifiquem a simples eliminação da cobrança da tarifa da assinatura básica no STFC.
Mais do que isto, a simples eliminação da assinatura básica no STFC geraria, com certeza, uma banalização da demanda, provocando uma desordenada proliferação de terminais em serviço e, conseqüentemente, um desequilíbrio indesejável no sistema.
Quanto aos valores hoje praticados para essa assinatura, esses sim, devem ser necessariamente revistos porque, além dos desequilíbrios econômicos sobejamente demonstrados em desfavor do consumidor, existe um grito da sociedade contra uma exorbitância. Grito este procedente pela sua legitimidade política”.
Foram os fatos acima descritos que levaram a Entidade Impetrante a submeter este importante pleito ao Poder Judiciário, com o objetivo de impedir que se consolide por vinte anos situação jurídica que inviabilizará, inclusive, a atuação do Poder Público, no sentido de fazer valer as garantias estabelecidas pelas leis que servem de fundamento para este Mandado de Segurança.
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II – Os Fatos .As metas imaginadas para a telefonia fixa na ocasião em que foi desenhado o modelo que definiu os contornos da privatização não se concretizaram. Previa-se a meta de mais de cinqüenta e oito milhões de acessos instalados até 2005, porque se acreditava que haveria demanda para tanto, ao passo que se previa 58 milhões de acessos móveis em serviços. Veja-se, nesse sentido, gráfico constante de Relatório Anual da Anatel publicado em 2002, relativo aos dados de 2001, assinado pelo então Diretor Presidente Renato Navarro Guerreiro (doc. 7).
Previsão para 2005 feita em 2001 (Fonte: Anatel)
Em 2001, três anos após a privatização, podia-se afirmar que o crescimento do número de habilitação de linhas nas classes D e E foi muito significativo. De acordo com o gráfico divulgado pela Agência em 2001, 87% dos lares da classe C e 51% dos lares da classe D tinham acesso a uma linha fixa.
Porém, a situação mudou, pois os aumentos abusivos do preço da assinatura inviabilizaram que essa situação de consolidasse. Tanto é assim, que já houve 41 milhões de acessos em uso em 2002 e hoje há menos de 37,7 milhões de acessos em uso, de acordo com a ANATEL.
A expectativa de que houvesse em 2005 a relação de trinta e dois acessos em uso para cada grupo de cem habitantes também não se realizou. O gráfico abaixo corresponde à expectativa divulgada em 2002 e calculada em 2001.
Densidade esperada em 2001 (Fonte: Anatel)
De acordo com dados divulgados pela Teleco – Informação em Telecomunicações (
www.teleco.com.br), os números relativos a 2004 demonstram que hoje há menos do que 20 telefones fixos em uso para cada grupo de 100 pessoas.
Densidade Fixa – Dez/2004
Os pequenos e mais pobres consumidores que perderam seu acesso à telefonia fixa migraram para a telefonia móvel e a prova dessa afirmação é o fato de que 80% dos telefones móveis funcionam no sistema pré-pago e têm uma média mensal de gasto, segundo a Associação Nacional das Operadoras Celulares – ACEL, de R$ 4,00. Veja-se o mapa abaixo.
Densidade Celular – Dez/2004
Existem hoje 81 milhões de linhas móveis habilitadas e não 58 milhões como previsto inicialmente, sendo que desse total, 80% funcionam no sistema pré-pago, com uma média mensal de recarga, repita-se, muito reduzida de R$ 4,00 mensais. Além disso, essas linhas estão concentradas nas classes C, D e E.
Esses fatos permitem concluir que milhões de consumidores mais pobres, por não possuírem renda para habilitar linhas fixas, que, de acordo com o modelo, constitui-se como serviço essencial prestado sob o regime público, ficam sujeitos ao serviço móvel pessoal, com preços muito superiores e prestado sob o regime privado.
Os últimos dados divulgados pela Teleco mostram que o número de acessos fixos em uso continua apresentando queda progressiva. Veja os números por região.
Acessos e localidades atendidas (Concessionárias, Jul/05)
Fonte: Anatel, não inclui autorizadas.
Região I - Telemar
Estado
Em serviço
Instalados
TUP
Localidades
RJ
4.841.000
4.958.917
124.072
793
ES
709.005
795.112
20.673
471
MG
3.685.883
4.137.229
122.565
3.198
BA
1.621.812
2.104.109
81.064
3.614
SE
194.320
277.175
12.044
729
AL
247.629
305.562
18.240
914
PE
972.011
1.175.863
52.203
1.040
PB
358.691
435.020
22.710
951
RN
339.184
396.215
20.913
1.011
CE
745.699
933.687
52.364
2.726
PI
238.612
281.177
18.420
910
MA
409.341
513.928
33.331
1.588
PA
550.912
703.305
39.709
1.196
AP
63.104
77.578
3.713
88
AM
375.114
447.299
18.702
587
RR
49.273
66.192
2.670
115
Total
15.401.590
17.608.368
643.393
19.931
Região II – Brasil Telecom
Estado
Em serviço
Instalados
TUP
Localidades
AC
87.067
98.847
4.030
76
MT
496.781
527.874
17.325
636
RO
205.079
256.867
7.751
163
MS
502.133
537.613
14.747
381
GO
1.164.164
1.292.388
42.550
695
TO
147.719
165.656
8.695
369
DF
786.087
885.610
22.451
16
RS
2.451.680
2.912.417
72.416
1.993
SC
1.461.345
1.591.735
41.172
2.251
PR
2.415.990
2.737.405
70.532
2.601
Total
9.718.045
11.006.412
301.669
9.181
Região III - Telefonica
Estado
Em serviço
Instalados
TUP
Localidades
SP
12.600.143
13.478.272
337.040
2.051
Ou seja, tem-se 37,7 milhões de acessos em serviço, em 2005, contra 39,2 milhões, em 2003. Um decréscimo de 5,4% em menos de dois anos, quando a finalidade seria ampliar o acesso e não reduzi-lo.
Com base nos fatos acima, é certo concluir que o serviço básico, prestado em regime público e que, portanto, deveria estar ampliando o acesso, vem sendo paulatinamente retirado dos consumidores, por absoluta ausência de instrumentos regulatórios para que essa situação se reverta.
Ocorre que, prorrogados os contratos sem que se revejam as cláusulas de reajuste do Plano Básico, o Poder Público não terá como reverter esse quadro, pois, apesar dos prejuízos amargados pelos consumidores que se tornam inadimplentes e que vêm seus nomes serem incluídos nos serviços de proteção ao crédito, a assinatura básica continua gerando a maior receita para as empresas. Veja-se a tabela abaixo, constante do último relatório da Ouvidoria da ANATEL (doc. 6).
É fácil concluir, então, de onde vem a força do interesse que move o lobby das concessionárias na ANATEL para resolver pendências fundamentais para a sociedade, com base em processos antidemocráticos, evitando ampla participação e a efetiva defesa dos interesses dos consumidores em geral e também das empresas competidoras.
O quadro fica ainda mais alarmante quando se constata que há falta grave e ilegal de estímulo para que as concessionárias reduzam o preço da assinatura. A gravidade da situação se acentua, quando se considera que não há impedimentos para que um mesmo grupo econômico tenha participação acionária tanto nas empresas de telefonia fixa, quanto nas empresas de telefonia móvel, como é o caso da Vivo, que se constitui como Joint Venture com participação igual da Telefonica e da Portugal Telecom e da Oi, que tem participação acionária da Telemar.
Sendo assim, o crescimento da densidade no segmento da telefonia móvel é positivo para as holdings que também operam a telefonia fixa, pois mantêm as linhas fixas nas mãos dos consumidores que têm poder aquisitivo para arcar com o peso de seu preço, e ainda ganham com as ligações que aqueles que têm de se submeter ao telefone pré-pago realizam.
Apesar da clareza solar do quadro acima, o modelo de contrato de concessão que está para entrar em vigor não traz NENHUM instrumento que incentive a diminuição do preço dos itens do Plano Básico; ao contrário, como se verá a seguir.
A ANATEL está ignorando a necessidade de ajustes no modelo, o que é público e notório (doc. 8). Esse entendimento é compartilhado entre consumidores e empresas competidoras que vivem verdadeira batalha para conseguirem se manter no mercado (doc. 9).
A convergência de tecnologias e meios é uma realidade para a qual o atual modelo não está pronto. A assinatura dos contratos de concessão do modo como estão significarão o atrelamento do setor à realidade de 1996.
III – O Prazo do Modelo de Contrato de Concessão do STFC – Cláusula 3 e As Regras de Reajuste de Tarifas – Cláusula 121. A Cláusula de Reajuste da Assinatura Básica
As fórmulas de reajuste de preço das tarifas, previstas no novo contrato, continuam a permitir uma situação de extremo privilégio para as concessionárias, que terminam por subsidiar a concorrência que se opera no segmento de longa distância, banda larga e outros serviços corporativos com os aumentos que podem impor aos consumidores submetidos ao regime de monopólio privado.
Essa situação reflete grande prejuízo não só para os consumidores mais pobres, mas também para a concorrência, já que as concessionárias gozam de uma situação extremamente privilegiada.
Repetir essa estrutura tarifária significará grande prejuízo, que se perpetuará por pelo menos cinco anos (cláusula 3 – 3.2 do contrato de concessão) – tempo que está previsto para a primeira revisão, dentro dos vinte anos de vigência dos próximos contratos (doc. 10).
Isto porque a fórmula de reajuste expressa na cláusula 11 dos atuais contratos e na cláusula 12 dos contratos que estão por vir permite que as concessionárias apliquem anualmente sobre o preço da assinatura, além da correção monetária, mais um percentual que significa verdadeiro aumento – até 9%, nos contratos atuais e até 6%, nos contratos que estão para ser assinados (cláusula 12.1).
O grave é que, vale repetir, as assinaturas, pulsos e cartões telefônicos são serviços prestados em regime público justamente porque são os serviços básicos e que deveriam apresentar preços acessíveis e adequados para o padrão econômico da grande maioria dos cidadãos brasileiros.
Porém, a evolução dos preços demonstra que a Agência vem falhando quanto ao seu papel constitucional de garantir o acesso. Em novembro de 1995, o valor da assinatura correspondia a R$ 0,61 (sessenta e um centavos de reais), que, atualizado pelo INPC até abril deste ano, corresponde a R$ 1,25 (um real e vinte e cinco centavos).
Passados dez anos, o valor da assinatura corresponde hoje, em média, a R$ 40,00 (quarenta reais). Portanto, podemos afirmar que o consumidor amargou um aumento real quanto à tarifa da assinatura no patamar de aproximados 3.100% (três mil e cem por cento).
É certo que os valores praticados no passado estavam defasados com relação ao efetivo custo da prestação do serviço, pois antes da Reforma do Estado, os governos valiam-se dos preços públicos para conter a alarmante e exagerada inflação que assolou o país até os anos 1995.
O valor da assinatura praticado hoje, no valor médio de R$ 40,00 (quarenta reais) representa mais do que 10% do salário mínimo e é insustentável para os cidadãos de baixa renda. É este o motivo que tem levado à mobilização nacional contra a cobrança de assinatura e que tem envolvido os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Deixando-se de lado a análise do impacto social da inadequação da estrutura tarifária ora em vigor e que se repetirá com a entrada em vigor dos novos contratos, o certo é que também pela análise estritamente jurídica esta estrutura tarifária contraria tanto a Constituição Federal, quanto o Código de Defesa do Consumidor e a Lei Geral das Telecomunicações.
A Constituição Federal, porque o art. 175 é claro ao determinar que cabe ao Poder Público garantir o acesso aos serviços essenciais e, ainda, porque o art. 170, ao dispor sobre os fundamentos e princípios da ordem econômica, atribui grande importância à defesa do consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor é desrespeitado porque de acordo com o art. 4°, que estabelece a Política Nacional das Relações de Consumo, cabe ao Poder Público garantir racionalização e melhoria aos serviços públicos, sendo que a modicidade das tarifas é elemento fundamental para se alcançar estas finalidades.
Também o art. 6°, do Código de Defesa do Consumidor, estabelece como direito básico a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos.
Veja-se transcrição de parte de sentença judicial proferida em Ação Civil Pública, cujo objeto é a declaração de nulidade de parte da cláusula 11, dos atuais contratos, proferida pela I. Juíza Federal, Dra. Louise Vilela Leite Filgueiras, que tramitou na 8ª Vara da Justiça Federal, ora em fase de apelação, sendo que, no dia 18 de novembro último, a I. Desembargadora Diva Malerbi, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, atribuiu efeito suspensivo ao recurso da Telefonica e Anatel (doc. 11):
“(...)
Passo à análise do mérito. O pedido é procedente.
As premissas levadas em consideração para a conclusão são as seguintes, sobre as quais se discorrerá em seguida:
1. Trata-se de serviço público de competência da União Federal;
2. 2. O serviço é executado por ente privado mediante contrato de concessão;
3. O serviço é remunerado por tarifa, não por preço privado;
4. A cláusula 11 é de reajuste, não de revisão;
5. A revisão do equilíbrio-financeiro do contrato de concessão tem parâmetros próprios estipulados na lei de telefonia;
6. A cláusula encerra revisão do equilíbrio financeiro do contrato por conter fator multiplicador portanto de aumento de preço, além do índice de correção monetária, IGP-DI, para cada item de produto isoladamente;
7. Os aumentos podem ser abusivos mesmo em se respeitando a cláusula 11, que prevê para os preços globalmente considerados o reajuste inflacionário, mas para cada item dentro do grupo de itens variação possível de até 9% sobre o IGP-DI.
8. O contrato se rege pelas cláusulas do direito do consumidor por encerrar relação de consumo direta entre o usuário (consumidor) que paga pelo serviço público e o ente que o presta (fornecedor, concessionário) mediante aplicação da cláusula do contrato de concessão.
9. O contrato se rege pelos princípios de direito administrativo, da legalidade, da licitação, do equilíbrio financeiro do contrato, e do interesse público, que devem ser observados para a regulamentação da remuneração por tarifa, preço público, ainda que prestado por empresa privada.
(...)
Note-se que no caso, a lei vincula o serviço essencial, que deva ser prestado de forma universal, isto é, cujo acesso deva ser proporcionado à toda a população ao regime de direito público.
(...)
Contudo, do ponto de vista do usuário do serviço, e do preço de cada item individualmente considerado, o ônus poderá ser, por vezes muito superior ao do reajuste inflacionário, dada a flexibilização de preços que a equação de regência permite para cada item.
Isso porque o consumidor final não faz uso do pacote de serviços nem tem a mesma necessidade de utilizar-se de cada um deles. O aumento concentrado de um serviço assinatura residencial, por exemplo, poderá onerar de forma desproporcional o usuário daquele serviço, em relação a outro que dele não faça uso.
Portanto, para o destinatário final a cláusula encerra possibilidade de revisão da tarifa sob o manto de reajuste inflacionário, podendo acarretar aumento de até 9% sobre o preço reajustado pelo IGP-DI, ressaltando-se ainda que o aumento será acumulável ano a ano, pois dispõe o contrato de concessão que será realizado o ‘reajuste’ anualmente.
(...)
Isso permite que a empresa privada gerencie os preços de forma que o aumento se dê quanto ao serviço de maior demanda, permitindo assim que obtenha vantagem de acordo com a oscilação do mercado. Tal seria bom e legítimo, se não estivéssemos tratando de tarifa e ainda, desde que não pudesse resultar em aumento abusivo de preços ao consumidor.
(...)
NECESSÁRIO, PARA CORRIGIR DISTORÇÕES SERIA CRIAR ÍNDICE ESPECÍFICO PARA O SETOR DE TELEFONIA, QUE LEVASSE EM CONSIDERAÇÃO A INFLAÇÃO DOS ITENS QUE COMPÕEM OS CUSTOS DESSE SERVIÇO.
(...)
VISTO QUE O ÍNDICE ESCOLHIDO É REALMENTE DOS MAIS ALTOS QUE SE TEM CONHECIMENTO, TENDO ACUMULADO, NO PERÍODO ENTRE JUNHO DE 2002 E MAIO DE 2003, VARIAÇÃO DE 30,03% (INFORMAÇÃO DISPONÍVEL NO SITE DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS ...), FICA AINDA MAIS EVIDENTE QUE AUMENTO DE 9% SOBRE O PREÇO REAJUSTADO PELO IGP-DI, CONFORME PREVÊ A QUESTIONADA CLÁUSULA, PODE SIM RESULTAR EM ÔNUS EXCESSIVO, PREÇO ABUSIVO, PARA O USUÁRIO, O CONSUMIDOR.
O SERVIÇO DE TELEFONIA FIXA, QUE COMPREENDE HABILITAÇÃO, ASSINATURA, PULSO E ASSIM OS CARTÕES, É ESSENCIAL, PRESTADO EM REGIME PÚBLICO, A ELE DEVEM TER ACESSO AS CAMADAS DA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA, E ENTENDA-SE POR ACESSO O PREÇO QUE PERMITA A UTILIZAÇÃO BÁSICA DO SERVIÇO, SEM QUE ISSO COMPROMETA A FRUIÇÃO DOS DEMAIS ITENS BÁSICOS PARA A SUBSISTÊNCIA DIGNA.
(...)
Expostas essas razões, julgo PROCEDENTE O PEDIDO INICIAL para declarar a nulidade parcial da cláusula 11.1. do contrato de concessão firmado entre companhias telefônicas Telesp – Telecomunicações de São Paulo S/A e CTBC – Companhia Telefonica da Borda do Campo, ambas denominadas TELEFONICA, e a ANATEL, ...”.
A sentença acima deixa cristalina a ilegalidade desta parte da cláusula de reajuste do contrato em vigor, que se repete no modelo de contrato previsto para vigorar a partir de janeiro de 2006.
E os números acima mencionados permitem concluir que está havendo a exclusão de milhões de consumidores da condição de assinantes do serviço de telefonia fixa comutada e, mantendo-se essa situação, a ilegalidade se perpetrará, em desrespeito frontal aos arts. 1°, inc. III; 3°, inc. III; 5°, inc. XXXII e 175, da Constituição Federal.
Relevante ressaltar, outrossim, que a Lei Geral da Telecomunicações, também está sendo desrespeitada, tendo em vista o que dispõem os arts. 70 e 103. Veja-se:
“Art. 70. Serão coibidos os comportamentos prejudiciais à competição livre, ampla e justa entre as prestadoras do serviço, no regime público ou privado, em especial:
I - a prática de subsídios para redução artificial de preços;
II - o uso, objetivando vantagens na competição, de informações obtidas dos concorrentes, em virtude de acordos de prestação de serviço;
III - a omissão de informações técnicas e comerciais relevantes à prestação de
serviços por outrem.
Art. 103. Compete à Agência estabelecer a estrutura tarifária para cada modalidade de serviço.
§ 1o A fixação, o reajuste e a revisão das tarifas poderão basear-se em valor que corresponda à média ponderada dos valores dos itens tarifários.
§ 2o São vedados os subsídios entre modalidades de serviços e segmentos de usuários, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 81 desta Lei.
§ 3o As tarifas serão fixadas no contrato de concessão, consoante edital ou proposta apresentada na licitação.
§ 4o Em caso de outorga sem licitação, as tarifas serão fixadas pela Agência e
constarão do contrato de concessão”.
A despeito da clareza solar da lei, está havendo um subsídio às avessas. Os serviços que são utilizados por consumidores corporativos e/ou mais ricos vêm sofrendo uma queda significativa dos preços, ao passo que os serviços consumidos pelos consumidores mais pobres, que não se beneficiam da redução dos preços nas chamadas de longa distância, banda larga e outros, suportam o peso da concorrência por meio dos ilegais aumentos impostos sobre a assinatura.
Esta fórmula de reajuste garante às concessionárias posição extremamente vantajosa no mercado. Além de serem detentoras de toda a infraestrutura que lhes permite ganhos decorrentes de contratos de acesso da rede, possuem um grande segmento do mercado, no qual atuam em regime de monopólio, que lhes possibilita compensar a redução do preço da tarifa dos itens que enfrentam concorrência. E esta é uma realidade que impede a ampliação da concorrência não só no segmento de telefonia fixa local, como na transmissão de dados em geral.
O modelo do contrato que está para entrar em vigor não modifica essa realidade. Pelo teor da Cláusula 12 é possível constatar que permanece a atribuição de faculdade para que as concessionárias apliquem sobre a assinatura residencial, além da correção monetária, mais 6% (seis por cento). Veja-se a fórmula: AssRes t < AssRes to x 1,06 x Ft.
.2. A Modicidade da Tarifa como Indicador de Qualidade do Serviço
.Reconhece-se a importância da Cláusula 6.1. da minuta do contrato, que inclui nos requisitos para que se configure a qualidade do serviço a modicidade da tarifa, além da regularidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade e cortesia, assim como o faz a Lei de Concessões, não há instrumentos que garantam a aplicação deste princípio.
Todavia, o § 7°, desta cláusula, ao definir o princípio da modicidade, estabelece que este se caracteriza “pelo esforço da Concessionária em praticar tarifas inferiores às fixadas pela Anatel”.
Trata-se, então, de cláusula revestida de alto grau de subjetividade e que quase nenhuma garantia oferece ao consumidor. Principalmente se se considera os poucos instrumentos regulatórios para estímulo de redução de preço no caso dos itens do Plano Básico. O vocábulo “esforço” é vago e não há dispositivos complementares para delimitar o seu alcance.
No entanto, a mais autorizada doutrina do Direito Administrativo, expressa pela lição de Hely Lopes Meirelles, indica que a instrumentalização do princípio da modicidade é fundamental para que os serviços essenciais cumpram a sua finalidade. Veja-se:
“REGULAMENTAÇÃO E CONTROLE
A regulamentação e controle do serviço público e de utilidade pública caberão sempre e sempre ao Poder Público, qualquer que seja a modalidade de sua prestação aos usuários. O fato de tais serviços serem delegados a terceiros, estranhos à Administração Pública, não retira do Estado seu poder indeclinável de regulamentá-los e controlá-los, exigindo sempre sua atualização e eficiência, de par com o exato cumprimento das condições impostas para sua prestação ao público. (...)
O fim precípuo do serviço público ou de utilidade pública, como o próprio nome está a indicar, é servir ao público e, secundariamente, produzir renda a quem o explora. Daí decorre o dever indeclinável de o concedente regulamentar, fiscalizar e intervir no serviço concedido sempre que não estiver sendo prestado a contento do público a que é destinado”
[2].
A conclusão que a lição acima permite é a de que ao se tratar de serviço público essencial, como é o caso da telefonia fixa local, o órgão regulador e a concessionária devem se orientar pelo princípio do menor lucro. Todavia, perpetrando-se a prorrogação dos contratos, sem que se modifiquem algumas de suas cláusulas, a garantia do princípio da modicidade estará mortalmente comprometida.
Isto porque, assinado o contrato, as assinaturas permanecerão sujeitas a aumento real todo ano de até 6%, o que fatalmente ocorrerá, como ocorreu nos últimos sete anos. Veja-se, Excelência, que de acordo com o relatório da Ouvidoria da ANATEL, mais de 51% da receita das concessionárias é proveniente das assinaturas.
.3. O Equilíbrio Econômico Financeiro do Contrato em Favor do Consumidor.
Ainda que o Contrato de Concessão se enquadre na classificação de contrato administrativo, não se pode esquecer que, tratando-se de serviço prestado diretamente ao consumidor, contemplado expressamente pelo Código de Defesa do Consumidor, as disposições constantes desta Lei devem ser observadas para a fixação dos direitos e obrigações das partes envolvidas.
Nesse sentido, vale destacar que o art. 6°, inc. V, do Código de Defesa do Consumidor, prevê expressamente o direito de: “V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas”.
A despeito do direito básico do consumidor à revisão do contrato por fatos supervenientes, o fato é que o Modelo de Contrato de Concessão em questão não traz nenhum instrumento que garanta o equilíbrio econômico financeiro do contrato em favor do consumidor.
Inserir no contrato um instrumento que garanta o equilíbrio entre as partes, evitando vantagens exageradas para um ou outro contratante, possibilitará a correção de eventuais distorções que possam vir a ocorrer por alterações na conjuntura econômica, por exemplo, que venha a afetar a evolução de índice de correção monetária, entre outras razões.
Os vinte anos previstos para duração dos contratos – prazo inadequado ao dinamismo do setor, como já se asseverou – demandam instrumentos que possibilitem a revisão do contrato não só em favor da concessionária, como está previsto na Cláusula XIII, mas também e principalmente em favor do consumidor.
.
4. O Oferecimento de Planos Alternativos é Facultativo – A Cláusula XI.
E nem se diga que por meio dos AICE – Acesso Individual de Classe Especial, também denominados de Planos Alternativos, a garantia de acesso será alcançada. Até porque a Agência se apressou para, em seis meses apenas, regulamentar assuntos de caráter econômico para garantir os interesses das empresas, mas ainda não regulamentou o AICE (doc. 12.).
Isto porque, a Cláusula XI do modelo do Contrato de Concessão estabelece sobre o Regime Tarifário e sobre a Cobrança dos Usuários atribui à concessionária a obrigatoriedade de oferecer apenas o Plano Básico para todos os consumidores, ao passo que os Planos Alternativos são de oferecimento facultativo pelas concessionárias ao mercado; e, pior, podem ser retirados do mercado a qualquer momento, ao sabor da conveniência da concessionária, submetendo o consumidor à adesão a um plano mais caro ou à perda de acesso ao serviço.
.
IV – O Cabimento de Alteração do Modelo do Contrato de Concessão .A Lei Geral de Telecomunicações determina que:
“Art. 5° Na disciplina das relações econômicas no setor de telecomunicações observar-se-ão, em especial, os princípios constitucionais da soberania nacional, função social da propriedade, liberdade de iniciativa, livre concorrência, defesa do consumidor, redução das desigualdades regionais e sociais, repressão ao abuso do poder econômico e continuidade do serviço prestado no regime público”.O quadro descrito na introdução desta inicial, relativo à inadequação das tarifas do Plano Básico e suas graves conseqüências, quais sejam: a) inviabilidade de acesso do serviço público essencial básico para milhões de consumidores; b) ausência de concorrência no setor de telefonia fixa local, com graves reflexos para outros segmentos do mercado, indicam que a ANATEL deve definir regras, a fim de garantir a eficácia dos princípios estabelecidos pelo art. 5°, da LGT.
Nessa direção, importante considerar que a previsão de renovação dos contratos em questão por mais vinte anos, bem como as regras jurídicas instituídas por meio do Modelo de Contrato do STFC Modalidade Local, foram feitas sem que os rumos do setor estivessem totalmente definidos como se encontram hoje.
É certo que as concessionárias já formalizaram seu interesse de prorrogar o contrato de concessão em vigor, o que gera direitos para essas empresas.
Entretanto, como ensina Marçal Justen Filho, também os consumidores integram a relação contratual nos contratos de concessão e seus direitos devem também ser levados em conta, como aliás está expresso no art. 5°, da LGT, transcrito acima. Veja-se:
“Os usuários são parte no contrato de concessão, mas não na condição individual. São assim considerados no seu conjunto, enquanto uma espécie de categoria, formada a partir da comunhão de interesses na fruição do serviço. Por isso, sua participação se fará por meio de instituições representativas.
Como categoria, os usuários têm direito de manifestação sobre o modo de concepção do empreendimento, a fixação do serviço adequado e a política tarifária. Devem participar da fiscalização sobre a concessionária, mas também lhes é assegurado controlar a própria atividade do poder concedente.
(...)”
[3].
Ainda que as minutas do contrato de concessão ora em tela tenham passado por processo de audiência pública, não podemos esquecer que a conjuntura há quase três anos atrás – época em que foi editada a Resolução com a Minuta dos Contratos – era diversa.
Além disso, não se pode esquecer que os procedimentos de consulta na ANATEL se dão com prazos curtíssimo para a apresentação de contribuições e com uma assimetria muito grande entre o nível de informação e qualificação para participação de forma efetiva e consistente, se se comparam as condições de informação das concessionárias e dos consumidores.
Há, sem dúvida, clara sobreposição de direitos frente às circunstâncias que se apresentam – direito das concessionárias e direito dos consumidores. Porém, considerando-se a natureza do serviço público essencial, devem ser invocadas lições de Direito Administrativo correspondentes às hipóteses de aplicação do princípio da proporcionalidade, a fim de se solucionar o impasse. Invocamos novamente as lições de Marçal Justen Filho a esse respeito, verbis:
“O Chamado ‘princípio da proporcionalidade’
Um instrumento fundamental e indispensável para a existência do sistema jurídico e a preservação dos valores fundamentais é o princípio da proporcionalidade.
A maioria dos instrumentos hermenêuticos não é adequada para resolver problemas gerados pela contraposição de princípios de idêntica hierarquia e, eventualmente, consagrados em um mesmo corpo legislativo. A concretização do direito para o caso concreto refletirá um processo de ponderação de princípios e interesses em conflito. Deverá haver critérios para a realização dessa escolha.
(...)
O princípio da proporcionalidade desenvolveu-se a partir do direito alemão, encontrando-se amplamente integrado no direito europeu nos dias atuais. O próprio Tratado da Comunidade Européia explicitamente o consagrou, ainda que a propósito da prevenção de conflitos de competência entre a Comunidade e os Estados-membros.
Aludido princípio passou a ser adotado amplamente como critério de composição de conflitos normativos, especialmente no tocante ao exercício de funções estatais.
No Brasil, a proporcionalidade não está prevista de modo expresso na Constituição, mas deriva da consagração normativa de uma pluralidade de princípios e regras que podem entrar em conflito. A proporcionalidade reflete a necessidade de prestigiar todos os princípios e regras albergados pelo direito.
Uma das peculiaridades do princípio da proporcionalidade consiste no reconhecimento de que a solução jurídica não pode ser produzida por meio do isolamento do aplicador em face da situação concreta. Não é possível extrair a solução pelo exame de textos legais abstratos. O intérprete tem o dever de avaliar os efeitos concretos e efetivos potencialmente derivados da adoção de certa alternativa. Deverá selecionar aquela que se configurar como a mais satisfatória, não do ponto de vista puramente lógico, mas em vista da situação real existente.
MICHAEL KOHL esclarece que a ‘proporcionalidade de uma medida é estabelecida pela satisfação de um teste de três estágios: (1) a medida deve ser apropriada para o atingimento do objetivo (elemento de idoneidade ou adequação); (2) a medida deve ser necessária, no sentido de que nenhuma outra medida disponível será menos restritiva (elemento de necessidade); (3) as restrições produzidas pela medida não devem ser desproporcionadas ao objetivo buscado (elemento de proporcionalidade stricto sensu)’”
[4].
Nesse sentido, vale destacar que o Modelo de Contrato de Concessão do STFC trata do serviço essencial prestado em regime público e que deveria estar acessível para o mais pobre dos cidadãos, tendo em vista o que determinam os arts. 175, 1°, inc. III e 3°, incs. I, II, III e IV, da Constituição Federal.
Essencial considerar, ainda que, em menos de dois anos, o número de acessos em uso decresceu 5,4%, quando a finalidade da privatização dos serviços públicos foi ampliar o acesso e reduzir o preço, sendo que a diminuição do número de linhas habilitadas tem ocorrido justamente em virtude de aumento desproporcional do preço.
O aumento do preço da assinatura básica tem mobilizado a sociedade a lutar pela extinção desta cobrança, medida que, se adotada de forma isolada, sem que haja uma reformulação na estrutura tarifária, representará prejuízos que serão suportados paradoxalmente pelos consumidores mais pobres, que não se beneficiam da redução de preço relativa a serviços como longa distância, banda larga e outros serviços corporativos.
Sendo assim, volta-se à lição de Marçal Justen Filho, quanto às finalidades da regulação:
“A regulação estatal se orientaria, então, a evitar ou a concretização de falhas do mercado ou a ampliar a dinâmica dos fatos. Haveria o suprimento dos defeitos do mercado, intervindo sobre os processos de mercado para instaurar uma situação de maior eficiência econômica.
9.3. A regulação social – a segunda ‘onda regulatória’
Mas essas concepções mais antigas vêm sendo objeto de intensa revisão, a propósito do que se poderia identificar uma uma segunda onda intervencionista. Trata-se da regulação social, que assume outras propostas. Constatou-se que o mercado, ainda que em funcionamento perfeito, pode conduzir à não realização de certos fins de interesse comum. A tais questões já eram sensíveis mesmo os enfoques mais tradicionais, que reputavam cabível a intervenção estatal orientada a assegurar a redistribuição de rendas e a produzir consumo obrigatório de certos serviços. (educação, por exemplo).
Essas considerações acerca das deficiências do mercado eram acolhidas mesmo antes da cinfiguração do modelo de Estado Regulador. Muitas vezes, o mesmo antes da configuração do medelo de Estado Regulador. (...)
Com a drástica redução da atuação estatal direta, incrementou-se a concepção da regulação econômica como meio de controle das deficiências do mercado. No entanto, verificou-se que a realização de inúmeros outros fins, de natureza sóciopolítica, também deveria ser tomada em vista pela regulação. A intervenção estatal de natureza regulatória não poderia restringir-se a preocupações meramente econômicas. O Estado não poderia ser concebido como um simples ‘corretor de defeitos econômicos’ do mercado, mas lhe incumbiria promover a satisfação de inúmeros outros interesses, relacionados a valores não econômicos. Assim, o elenco dos fins buscados através da regulação escapa facilmente de uma abordagem exclusivamente econômica. (...)
A idéia de um Estado Regulador não significa a extinção da atuação estatal nesses planos, mas impõe uma intensificação da regulação jurídica sobre outros temas”
[5].
Firmar os contratos ora em discussão, fazendo tabula rasa da realidade do mercado de telefonia fixa e dos efeitos perversos que as distorções do modelo causa aos consumidores brasileiros, especialmente os mais pobres, bem como à inviabilização da concorrência no setor, representará conduta lesiva ao interesse público e uma afronta grave à Constituição Federal Brasileira.
Oportuno lembrar que o Tribunal de Contas da União, por meio do Acórdão 1778/2004, reconheceu que há parcela considerável da população sem acesso ao telefone particular, nos termos da ementa abaixo transcrita:
“Ementa
Auditoria Operacional. Ministério das Comunicações. Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel. Análise se as reformas regulatórias e a privatização do setor de telecomunicações efetivamente contribuíram para a ampliação e democratização do acesso aos serviços de telefonia. Avaliação do trabalho desempenhado pela Anatel para incentivar e fiscalizar o cumprimento das metas de universalização de acesso ao sistema fixo de telefonia comutado. Resultado positivo das reformas regulatórias e da privatização. Existência, contudo, de parcela considerável da população sem acesso a telefone particular. Deficiências relacionadas à metodologia de fiscalização do cumprimento das metas de universalização. Determinação. Recomendação. Remessa de cópia ao Congresso Nacional e a diversos interessados. Arquivamento”.
Não há sombra de dúvida, portanto, quanto ao fato de que o segmento de telefonia fixa local está demandando uma atuação regulatória mais afinada com a nova tendência, posto que estão presentes todos os requisitos que a justificam.
Ademais, seria precipitado firmar contratos pelo prazo de vinte anos com a configuração do atual cenário, pois o engessamento da atuação regulatória poderá representar risco significativo para a sustentabilidade do setor, especialmente neste momento em que governo, empresas, reguladores e especialistas debatem a reformulação do modelo e que pontos fundamentais como o índice de correção monetária a indexar as tarifas, conversão do sistema de medição de pulso para minuto, entre outros, estão ainda em aberto.
VII – As Ilegalidades perpetradas pela ANATEL para a Prorrogação dos Contratos de Concessão – O art. 1° da Lei 1.533/51Além da falha grave cometida pela Agência, ao não observar de forma responsável todo o espectro e abrangência de sua atuação, pois se esqueceu do consumidor residencial e vem ignorando as alterações da realidade do setor e a inadequação do modelo para os novos rumos tecnológicos, que se manifestam pela convergência, ainda cometeu no último semestre outra série de ilegalidades, quais sejam:
1. O Decreto 4.733, de 10 Julho de 2003
O Decreto 4.733/2003, que “dispõe sobre políticas públicas de telecomunicações e dá outras providências”, estabelece:
“Art. 4o As políticas relativas aos serviços de telecomunicações objetivam:
I - assegurar o acesso individualizado de todos os cidadãos a pelo menos um serviço de telecomunicação e a modicidade das tarifas;
II - garantir o acesso a todos os cidadãos à Rede Mundial de Computadores (Internet);
III - o atendimento às necessidades das populações rurais;
IV - o estímulo ao desenvolvimento dos serviços de forma a aperfeiçoar e a ampliar o acesso, de toda a população, às telecomunicações, sob condições de tarifas e de preços justos e razoáveis;
V - a promoção do desenvolvimento e a implantação de formas de fixação, reajuste e revisão de tarifas dos serviços, por intermédio de modelos que assegurem relação justa e coerente entre o custo do serviço e o valor a ser cobrado por sua prestação, assegurado o equilíbrio econômico-financeiro do contrato;
VI - a garantia do atendimento adequado às necessidades dos cidadãos, relativas aos serviços de telecomunicações com garantia de qualidade;
VII - a organização do serviço de telecomunicações visando a inclusão social.
Parágrafo único. Para assegurar o disposto nos incisos II e VII:
(Incluído pelo Decreto nº 5.581, de 2005) I - o Ministério das Comunicações fica incumbido de formular e propor políticas, diretrizes, objetivos e metas, bem como exercer a coordenação da implementação dos projetos e ações respectivos, no âmbito do programa de inclusão digital;
(Incluído pelo Decreto nº 5.581, de 2005) II - a Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL deverá desenvolver instrumentos, projetos e ações que possibilitem a oferta de planos de serviços de telecomunicações, observando as diretrizes e metas estabelecidas pelo Ministério das Comunicações e o regime de tratamento isonômico como instrumento para redução das desigualdades sociais.
(Incluído pelo Decreto nº 5.581, de 2005) Art. 5o As políticas relativas à indústria de telecomunicações deverão contribuir para a absorção e desenvolvimento local, norteando-se pelos princípios e objetivos descritos nas
Leis nos 9.998, de 17 de agosto de 2000, e
10.052, de 28 de novembro de 2000. Art. 6o As políticas relativas ao desenvolvimento tecnológico das telecomunicações objetivam:
I - a promoção da pesquisa e o desenvolvimento de soluções tecnológicas voltadas, preferencialmente, para as necessidades e condições sócio-econômicas da população;
II - a aplicação prioritária dos recursos do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações - FUNTTEL e de outros estímulos existentes em projetos e programas que contemplem as soluções tecnológicas mencionadas no inciso I;
III - o aproveitamento das oportunidades geradas pelas transições e pelo processo de convergência tecnológica, para ampliar a tecnologia nacional no setor de telecomunicações;
IV - a garantia de que o desenvolvimento tecnológico do setor esteja diretamente destinado ao benefício social de seus resultados; e
V - o incentivo às instituições de pesquisa a desenvolverem novas tecnologias de acesso a serviços de telecomunicações.
Art. 7o A implementação das políticas de que trata este Decreto, quando da regulação dos serviços de telefonia fixa comutada, do estabelecimento das metas de qualidade e da definição das cláusulas dos contratos de concessão, a vigorarem a partir de 1o de janeiro de 2006, deverá garantir, ainda, a aplicação, nos limites da lei, das seguintes diretrizes:
I - a definição das tarifas de interconexão e dos preços de disponibilização de elementos de rede dar-se-á por meio da adoção de modelo de custo de longo prazo, preservadas as condições econômicas necessárias para cumprimento e manutenção das metas de universalização pelas concessionárias;
II - a definição do reajuste das tarifas de público será baseada em modelo de teto de preços com a adoção de fator de produtividade, construído mediante a aplicação de sistema de otimização de custos a ser implementado pela agência reguladora;
III - a definição e a classificação de Localidade, para efeito de serviços de telecomunicações, deverão considerar os critérios adotados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE;
IV - o conceito de Área Local levará em conta o crescente processo de urbanização da população e as peculiaridades regionais;
V - o acesso ao enlace local pelas empresas exploradoras concorrentes, prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo, será garantido mediante a disponibilização de elementos de rede necessários à adequada prestação do serviço;
VI - a revenda do serviço de telecomunicações das concessionárias deverá ser garantida às empresas exploradoras concorrentes;
VII - as modalidades de serviço de telecomunicação - local, longa distância nacional e longa distância internacional - terão contabilidade separada;
VIII - a possibilidade de ser assegurada aos assinantes de serviço de telecomunicações, residenciais e não residenciais, a portabilidade do número local;
IX - a possibilidade de ser assegurada, em todo o território nacional, a portabilidade dos códigos não geográficos;
X - a fatura das chamadas locais deverá, com ônus e a pedido do assinante, ser detalhada quanto ao número chamado, duração, valor, data e hora de cada chamada;
XI - a fatura das chamadas de longa distância nacional e internacional deverá, sem ônus para o assinante, informar o número chamado, duração, valor, data e hora de cada chamada;
XII - independentemente da quantidade de exploradoras envolvidas na prestação do serviço, deverá ser assegurada ao assinante a emissão de fatura única;
XIII - ao assinante serão assegurados meios de aferição dos serviços efetivamente utilizados; e
XIV - as participações acionárias, diretas ou indiretas, de pessoas jurídicas nacionais ou estrangeiras, em empresas exploradoras de serviços de telecomunicações deverão ser transparentes, de modo a permitir o conhecimento da composição de seu capital e a verificação do atendimento, entre outras, das exigências legais relacionadas com a competição efetiva, a desconcentração econômica do mercado, a idoneidade para a contratação e a exeqüibilidade do contrato;
XV - a viabilidade econômica da prestação do serviço em regime público será assegurada, em âmbito nacional, regional, local ou em áreas determinadas, quando concomitante com sua exploração em regime privado.
§ 1o O modelo a que se refere o inciso I deste artigo será construído mediante a aplicação de sistema de otimização de custos, a ser implementado pela agência reguladora, considerando os custos de amortização dos investimentos realizados para a prestação do Serviço Telefônico Fixo Comutado - STFC e as tarifas de interconexão das redes de suporte aos diversos serviços de telecomunicações, de forma sistêmica e balanceada, abrangendo todos os segmentos socioeconômicos e geográficos.
§ 2o Na fixação dos casos e condições em que se dará o acesso ao enlace local referido no inciso V deste artigo, bem como para a revenda mencionada no inciso VI, a agência reguladora, para garantir a justa competição, observará, entre outros, o princípio do maior benefício ao usuário, o interesse social e econômico do País e a justa remuneração da prestadora do serviço no regime público.
Art. 8o A Agência Nacional de Telecomunicações - ANATEL ao proceder à análise dos atos a que se refere o
art. 7o, § 1o, da Lei no 9.472, de 1997, deverá dar-lhes transparência e publicidade, estimulando a concorrência, nos termos da regulamentação, respeitadas as garantias de confidencialidade das informações.
Art. 9o Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 10 de junho de 2003; 182o da Independência e 115o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Miro Teixeira”
O Modelo de Contrato de Concessão a ser assinado foi publicado por meio da Resolução n° 341, de 20 de junho de 2003. Ou seja, há dois anos e cinco meses. Veja-se, Excelência, que o previsto era que a partir de janeiro de 2006 as chamadas passassem a ser medidas por minuto e faturadas de forma discriminada, propiciando a efetiva informação ao consumidor, nos termos do art. 6°, inc. III, do Código de Defesa do Consumidor.
A ANATEL e as concessionárias sempre trabalharam com o prazo de 1° de janeiro de 2006, para que as chamadas locais fossem discriminadas. Prova disso são as manifestações públicas da agência e de concessionárias em ações civis públicas cujo objeto consiste na imposição da obrigação do cumprimento do direito básico à informação (doc. 13).
Veja-se, nesse sentido, a fala do Superintendente de Serviços Públicos da ANATEL – Sr. Marcos Bafutto, a respeito do prazo para as concessionárias discriminarem os pulsos, em seminário ocorrido na Câmara do Deputados Federais, em 02 de junho deste ano, cujo tema foi a assinatura básica (doc. 14) :
“Sobre a discriminação de pulsos, Deputado Almir Moura, devo dizer que já consta do novo contrato, fixado e aceito pelas empresas a partir de junho de 2003, que a partir do final deste ano vai ser direito do usuário a discriminação das chamadas locais — e não vai ser mais pulso, e, sim, minuto. Aqueles que não quiserem receber a discriminação, porque quem faz muita chamada local vai receber um calhamaço de conta, vão poder fazer o controle pelo relógio”.
A despeito dessa realidade, no último dia 24 a ANATEL prorrogou por mais 8 meses o prazo para que as concessionárias discriminem as chamadas locais, em reunião do Conselho Diretor, a despeito de ter autorizado a prorrogação dos contratos. Além disso, sequer fez publicar o ato pelo qual promoveu a ilegalidade.
Não há dúvida, por conseguinte, que a ANATEL violou diversas determinações constantes do decreto acima, mas especialmente a que vincula a vigência dos novos contratos à discriminação dos pulsos.
A prorrogação se deu em virtude de dois fatos. O primeiro, a ineficiência da Agência, que se configura “por não ter sido capaz” de abrir consulta pública editar a Resolução com os critérios para a conversão da medição por pulsos pela medição por minutos, o que é vastamente vantajoso para as concessionárias e prejudicial para os consumidores, como se constata com as reclamações nos Procons de todo país, que se concentram na cobrança de valores indevidos.
O segundo fato, foi o pedido feito pela Abrafix – Associação Brasileira de Empresas de Telefonia Fixa à ANATEL para a prorrogação, pois as concessionárias alegavam que ainda não estavam prontas para realizarem as adaptações técnicas.
Ocorre que, repita-se, as concessionárias sabiam do prazo para cumprimento desta obrigação há mais de dois anos e meio e mesmo assim, de forma muito conveniente para elas próprias, quedaram-se inertes e contaram com o apoio da ANATEL, que corrobora a pecha de que atua sempre contra o consumidor.
2. A Condição Imposta pelo § 1°, do Art. 207, da Lei Geral de TelecomunicaçõesO § 1°, do art. 207, da Lei Geral de Telecomunicações, determina:
“Art. 207. No prazo máximo de sessenta dias a contar da publicação desta Lei, as atuais prestadoras do serviço telefônico fixo comutado destinado ao uso do público em geral, inclusive as referidas no art. 187 desta Lei, bem como do serviço dos troncos e suas conexões internacionais, deverão pleitear a celebração de contrato de concessão, que será efetivada em até vinte e quatro meses a contar da publicação desta Lei.
§ 1o A concessão, cujo objeto será determinado em função do plano geral de outorgas, será feita a título gratuito, com termo final fixado para o dia 31 de dezembro de 2005, assegurado o direito à prorrogação única por vinte anos, a título oneroso, desde que observado o disposto no Título II do Livro III desta Lei”.
E o Título II, do Livro III, da Lei trata dos Serviços Prestados em Regime Público e mais especificamente sobre as Obrigações de Universalização e de Continuidade.
É óbvio, portanto, que o legislador quis vincular a prorrogação da concessão ao cumprimento das metas. Destaque-se que o prazo para cumprimento das metas é 31 de dezembro de 2005 e que a ANATEL até a presente data não procedeu à fiscalização das referidas obrigações das concessionárias.
A despeito deste fato, autorizou a prorrogação dos contratos de concessão e marcou a assinatura para o próximo dia 7 de dezembro. Veja-se a notícia divulgada pelo site da Agência. Vale salientar que até esta data a ata da reunião onde se decidiu uma série de assuntos relevantes não foi publicada.
“Anatel aprova pedidos de prorrogação dos contratos
Brasília, 24 de novembro de 2005 – O Conselho Diretor (CD) da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) aprovou nesta quarta, na sua 372ª Reunião, as manifestações realizadas pelas concessionárias para a prorrogação dos contratos de concessão do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC). As concessionárias tinham, de acordo com a Resolução nº 341 da Agência, até 30 de junho de 2003 para manifestarem-se o interesse pela prorrogação dos contratos. Agora, com a aprovação das manifestações, a Anatel deverá convocar, no próximo dia 7 de dezembro, as concessionárias da telefonia fixa para assinatura da prorrogação.
Os 70 contratos de concessão do STFC foram assinados em 2 de junho de 1998 e têm seu final em 31 de dezembro de 2005, com direito à prorrogação, uma única vez, por mais 20 anos. Destes, 34 são na modalidade de serviço Local, 34 na modalidade Longa Distância Nacional Intra-Regional, um na modalidade Longa Distância Nacional e um na modalidade Longa Distância Internacional. Para prorrogação, as concessionárias terão de pagar pelo direito de exploração, estabelecido no Regulamento de Cobrança de Preço Público pelo Direito de Exploração de Serviços de Telecomunicações e serão obrigadas a recolher Taxas de Fiscalização de Instalação, além de pagar o Preço Público pelo Direito de Uso das Radiofreqüências.
Segundo parecer da Agência, as concessionárias vêm desempenhando satisfatoriamente o papel assumido contratualmente ao longo do prazo de concessão, podendo-se notar somente alguns descumprimentos pontuais. As prestadoras necessitaram cumprir metas de qualidade, estabelecidos no Plano Geral de Metas de Qualidade (PGMQ) e metas de universalização, impostas pelo Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU), dentre outras obrigações, para pleitearem a prorrogação dos contratos.
A partir da prorrogação, janeiro de 2006, as concessionárias estarão sujeitas aos novos regulamentos que estão sendo editados pela Agência, como, por exemplo, a Norma para Cálculo do Índice de Serviços de Telecomunicações (IST) e a Regulamento de Tarifação do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado em Regime Público.
A minuta dos novos modelos de contratos foram submetidas à Consulta Pública nº 426, em 26 de dezembro de 2002, pela qual a sociedade teve oportunidade de apresentar suas contribuições sobre as regras que serão aplicadas a partir de janeiro de 2006. Também foram realizadas audiências públicas nas cidades de Belém, São Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Recife e Brasília em março e junho de 2003.
Ricardo Lavalle - Assessoria de Imprensa – Anatel” (doc. 3)
Valiosa, nesse sentido, a conclusão do Tribunal de Contas a respeito da atuação fiscalizatória da ANATEL. Veja-se o Relatório da Ouvidoria da ANATEL a respeito deste aspecto (doc. 6):
“11.3. Parecer do Tribunal de Contas da União sobre a Fiscalização da Anatel
Infurtável para a Ouvidoria seria deixar de observar o acompanhamento dos órgãos de controle e fiscalização para com a Anatel, especialmente quando se diz respeito à egrégia Corte de Contas. Assim é que em 2003 foi aberto processo de nº 012.581/2003/3, perante o Tribunal de Contas, contra a Anatel, e que trata do Relatório de Auditoria de Natureza Operacional, com o objetivo de “analisar se as reformas regulatórias e a privatização do setor de telecomunicações efetivamente contribuíram para a ampliação e democratização do acesso aos serviços de telefonia, e avaliar o trabalho desempenhado pela Agência Nacional de Telecomunicações - Anatel, no sentido de incentivar e fiscalizar o cumprimento das metas de universalização de acesso aos Serviços Telefônico Fixo Comutado (STFC)”, consoante o Acórdão 1.1778/2004-TCU. Do Acórdão referido supra, vale trazer à baila que foi determinado à Anatel cumprir específicas providências com vistas à contribuição para a melhoria do desempenho das atividades fiscalizatórias. As principais cominações impostas à Agência dizem respeito aos Procedimentos para Apuração de Descumprimento de Obrigações (Pados) e à falta de efetividade na tramitação dos processos, a fim de apresentar reformulação dos processos de fiscalização das obrigações de universalização. O Plano elaborado pela Agência e em desenvolvimento, desde fevereiro/2005, com previsão de término em dezembro/2006, prevê quatro macro-atividades: a) definição do universo de localidades; b) acompanhamento e controle dos processos; c) adequação da estratégia de fiscalização; e d) processamento e julgamento de Pados. Entendemos que o cumprimento efetivo dessas macro-atividades está, em primeiro lugar, a depender de ações políticas que viabilizem o descontingenciamento orçamentário e, em segundo lugar, de ações internas que definam como prioritárias a fiscalização da prestação de serviços e a celeridade sancionatória”.
Portanto, está claro que o Conselho Diretor, por seu Presidente, está violando o § 1°, da Lei Geral de Telecomunicações. Note-se que a própria agência assume que há metas não cumpridas e regulamentos a serem aditados para complementar o contrato, mas ainda assim, a prorrogação foi autorizada.
Destaque-se, outrossim, que a Agência deixou para o último semestre de 2005 a definição de matérias fundamentais para que os novos contratos entrem em vigor, tais como a definição do Fator X, a definição do novo índice de correção monetária – agora o IST – Índice Geral do Setor de Telecomunicações, que veio substituir o IGP-DI –, os critérios de alteração da medição por pulso pela medição por minuto (que sequer foram colocados à consulta pública), a discriminação das chamadas locais e, também muito importante, a Resolução a respeito do AICE – Acesso Individual de Classe Especial (doc. 12).
Alega que promoveu audiências públicas. Entretanto, a despeito de ter recebido contribuições das associações civis, inclusive da Impetrante, não só deixou de incorporar as sugestões, mas também sequer respondeu ou explicou o motivo pelo qual as sugestões não foram aproveitadas.
Veja-se que a Entidade Impetrante vem, há bastante tempo, solicitando à ANATEL a divulgação de documentos relativos às audiências públicas, com base no argumento de que apenas 30 dias, sem ter acesso à documentação respectiva ao tema das Resoluções, é muito difícil garantir a participação democrática e a defesa efetiva dos interesses dos consumidores.
Note-se, outrossim, que muitas vezes o prazo para contribuição é inferior a trinta dias (doc. 15) para apresentação de contribuição pela sociedade. E, aduza-se, que para a alteração do prazo para agosto da medição por minuto e discriminação das faturas, sequer houve a instauração de audiência pública, o que configura claro desrespeito ao art. 42, da Lei Geral de Telecomunicações. Marçal Justen Filho ensina:
“9.2.1. A ausência de instrumentos de legitimação política
O primeiro e mais sensível defeito das agências é a ausência de legitimação democrática. A produção de regulação democrática. A produção de regulação fundada apenas em considerações técnicas pode comprometer a legitimação política das decisões adotadas.
(...)
2.3. Atuação processual para produção de regulamento
É possível organizar a evolução da atividade administrativa em determinadas etapas. Os prazos e características de cada etapa deverão ser fixados previamente, nunca podendo ser tão exíguos que impeçam o atingimento das correspondentes finalidades.
(...)
2.3.2 Etapa externa de consulta ao público
A segunda etapa deverá constituir-se em consulta ao público. Deverá levar-se em consideração não apenas o público em geral mas também as organizações específicas da sociedade civil que possam apresentar interesse acerca do tema”.
Está claro, então, que o contrato será assinado sem que questões fundamentais para sua execução tenham sido decididas, tais como e principalmente: o regulamento do AICE e os critérios de alteração da medição por pulso para a medição por minuto, ambos os temas com impacto fundamental e direto para os consumidores brasileiros.
VIII – O Direito Líquido e Certo e o Periculum in Mora – Pedido de Liminar
inaldita altera parte
Sendo assinados os novos contratos de concessão, independentemente do cumprimento das formalidades impostas pela Lei Geral e pelo Decreto 4.733/2003, os consumidores brasileiros de telecomunicações, substituídos nesta demanda pela Entidade Impetrante, nos termos do art. 5°, inc. XXI, da Constituição Federal, estarão sujeitos a se deparar com o argumento do direito adquirido das concessionárias quanto a aspectos irretorquivelmente ilegais, constantes dos contratos, que continuarão a ser debatidos por mais 20 anos nas barras dos Tribunais, como é o caso da abusividade do preço da assinatura básica, a falta de discriminação das chamadas locais, entre outros pontos.
As condições impostas pela Lei e pelo Decreto para a prorrogação dos contratos não estão sendo cumpridas, do que se conclui a ilegalidade a justificar a concessão do mandamus.
Volta-se às lições de Marçal Justen Filho:
“4.3.12.2.2 O elemento subjetivo na ilicitude dos administradores de agência
A relevância e a seriedade das tribuições reservadas às agências produz a configuração de dever de diligência extremamente severo, tal como acima apontado. Exige-se do sujeito que administra a agência muito mais do que a simples cautela ou a diligência necessária ao desempenho de função de menor relevo.
A agência reguladora é titular da competência de promover a consecução de valores constitucionais da importância superior, essenciais à dignidade da pessoa humana e indispensáveis à supressão das desigualdades sociais e regionais do Brasil. Aquele que se dispuser a assumir os encargos da administração da agência tem o dever de não falhar, não errar, não incorrer em defeito previsível que propicie a frustração dos resultados buscados. Tem o encargo de prever todas as variáveis, de considerar todas as circunstâncias, de adotar todas as providências necessárias ao bom desempenho da atividade regulatória”[6].
Destarte, imprescindível a atuação do Poder Judiciário para impedir 20 anos de extremo prejuízo para os consumidores brasileiros, atraso na introdução da convergência e ampliação da concorrência no mercado brasileiro.
O Supremo Tribunal Federal já se pronunciou a respeito da abrangência dos regulamentos das Agências, verbis:
“4.4. A Orientação Jurisprudencial
A esmagadora maioria da jurisprudência orienta-se no sentido de rejeitar a existência de regulamentos autônomos no sistema jurídico brasileiro.
4.4.1. A orientação do STF
A maior evidência dessa orientação reside na recusa do STF em promover o controle de constitucionalidade em abstrato a propósito de atos regulamentares. Como afirmou o Min. Celso de Mello, ao apreciar a medida liminar na ADIn n° 561-8-DF, ‘Se o ato regulamentar em questão desatender as prescrições legais, ou ultrapassa, em extensão, os comandos que lhe são inerentes, estar-se-á em face de uma questão de mera legalidade, e não de ofensa direta ao parâmetro constitucional invocado’.
2.6.3. O controle jurisdicional dos atos normativos concretos
As normas concretas produzidas pelas agências configuram-se como atos administrativos. Poderão ser objeto de questionamento perante o Poder Judiciário, tal como se passa com qualquer ato administrativo, segundo os princípios e nos limites tradicionalmente admitidos pela doutrina e jurisprudência.
Aplicam-se as considerações acima realizadas acerca do controle de competências discricionárias no âmbito de atos normativos abstratos”
[7].
É claro, Excelência, que assinados os contratos, sem que importantes e fundamentais questões relativas ao seu desenvolvimento tenham sido definidas ou submetidas ao processo de audiência pública, como determina o art. 42, da Lei Geral de Telecomunicações, a sociedade brasileira ficará refém da realidade plasmada nas cláusulas dos contratos por 20 anos.
É pelas razões acima que se requer liminar, nos termos do art. 7°, inc. II, da Lei 1.533/51, para:
A) Impedir que no dia 7 de dezembro o Presidente do Conselho Diretor da Anatel assine a prorrogação dos 70 contratos de concessão a vigorarem a partir de 1° de janeiro de 2006, por mais 20 anos;
B) Caso Vossa Excelência não admita o pedido acima, o que se admite apenas em respeito ao princípio da eventualidade, requer-se:
i) seja suspensa a decisão que adiou a data para o cumprimento pelas concessionárias da obrigação de proceder a medição por minuto e discriminar as chamadas locais, nos termos do art. 7°, inc. X, do Decreto 4.733/03
ii) que da cláusula 12 dos novos contratos de concessão sejam expurgados os 6% facultados às concessionárias a serem aplicados sobre o reajuste da assinatura básica, autorizando-se apenas a aplicação do índice de correção monetária.
IX – O Pedido
Diante de tudo o que se expôs requer a PRO TESTE seja concedida a liminar neste mandado de segurança, confirmando-se a ordem ao final do processo, julgando-se procedente o Mandado de Segurança e condenando-se a autoridade coatora a arcar com os ônus sucumbenciais.
Requer-se, ainda, seja notificado o impetrado, no endereço referido no preâmbulo desta petição, para que apresente suas informações no prazo legal, expedindo-se para tanto o devido ofício.
Dá-se à causa o valor de R$ 10.000,00.
São Paulo 29 de novembro de 2005
Flávia Lefèvre Guimarães
OAB/SP 124.443